O Ministério Público do Trabalho pediu o afastamento de Sérgio Camargo da presidência da Fundação Palmares por denúncias de assédio moral, perseguição ideológica e discriminação contra funcionários da instituição.
O pedido foi divulgado pelo Fantástico, da Globo, na noite deste domingo (29). Nos depoimentos divulgados pelo programa, funcionários do órgão dizem que Camargo associa pessoas de “cabelos altos” a malandros. Além disso, servidores concursados teriam pedido demissão por causa de um clima de terror psicológico criado na instituição sob o comando do atual presidente do órgão, que perseguiria o que ele define por “esquerdistas”.
Funcionários ainda dizem que Camargo chamava um ex-diretor da Palmares de “direita bundão” por não exonerar “esquerdistas” da Palmares. Além do afastamento, o Ministério Público do Trabalho também pede que Camargo pague indenização de R$ 200 mil por danos morais, segundo a TV.
O presidente da Fundação Palmares começou a ser investigado por suspeita de assédio moral contra funcionários em março deste ano. O inquérito foi aberto pelo Ministério Público do Trabalho no Distrito Federal, que passou a ouvir mais de uma dezena de pessoas. A apuração, feita em sigilo, foi aberta após o MPT receber diferentes denúncias de perseguição ideológica.
A reportagem procurou o Ministério Público do Trabnalho e a Fundação Palmares neste domingo, mas não teve resposta.
Nas redes sociais, Camargo se manifestou sobre temas relacionados à denúncia. Na tarde deste domingo, por exemplo, ele escreveu no Twitter que “ter orgulho do cabelo é ridículo para o negro”. Mais tarde, à noite, escreveu que o negro orgulhoso de seu cabelo é um “fracassado a serviço do vitimismo”.
Se você é preto e tem orgulho do seu cabelo, além de ridículo, será sempre um fracassado a serviço do vitimismo.
Se você é preto e tem orgulho do seu cabelo, além de ridículo, será sempre um fracassado a serviço do vitimismo.
— Sérgio Camargo (@sergiodireita1) August 30, 2021
Após a reportagem da TV Globo, ele escreveu nas redes sociais que, após a divulgação da denúncia e do pedido de afastamento da direção da Palmares, ouviu sonatas de Franz Schubert. Na mesma publicação, chamou pessoas de esquerda de “vermes”.
Direitistas, não precisam pedir que eu aguente. Lido com vermes da esquerda desde muito antes da minha nomeação! Estou ouvindo as sonatas de Franz Schubert, com o mestre alemão do piano Wilhelm Kempff, e dando blocks na esquerdalha imunda. Rotina…Mas obrigado pelo apoio. 🇧🇷😎✌️ pic.twitter.com/5hAaGvZu1i
— Sérgio Camargo (@sergiodireita1) August 30, 2021
Nomeado por Roberto Alvim, ex-secretário especial da Cultura, em novembro de 2019, Camargo acumula polêmicas e toma decisões questionadas na Justiça desde que foi escolhido para o cargo. Ele chegou a deixar a presidência da fundação no mês seguinte à nomeação, após a Justiça acatar uma ação civil que pedia a sua suspensão. O pedido dizia que ele contrariaria o cargo em razão de suas várias críticas feitas a Zumbi dos Palmares e ao movimento negro. Em 2020, no entanto, o STJ, derrubou a decisão.
“Eu acho que o garoto que foi liberado ontem é uma excelente pessoa”, disse Jair Bolsonaro na época, quando Camargo voltou à Palmares. O presidente da fundação é jornalista e se definiu ainda antes de comandar a instituição como “negro de direita, contrário ao vitimismo e ao politicamente correto”. Ele também já afirmou nas redes sociais que o Brasil tem “racismo nutella” e que “o racismo real existe nos EUA”.
À frente do órgão, que é responsável por preservar memória e cultura negra, Camargo empreendeu uma cruzada ideológica. Em junho deste ano, a Palmares publicou um relatório intitulado “Retrato do Acervo: A Doutrinação Marxista”, segundo o qual metade do acervo de livros da instituição seria excluído —entre os os títulos expuragados, estariam os de autores como Marx, Engels, Lênin, Weber, Hobsbawn, H. G. Wells, Celso Furtado e Marco Antônio Villa, além de Carlos Marighella.
“Além do imprestável Marighella, livros que promovem pedofilia, sexo grupal, pornografia juvenil, sodomia e necrofilia também estão com os dias contados na Palmares. Serão excluídos do acervo”, escreveu Camargo.
O deputado federal Marcelo Freixo entrou com uma ação na Justiça contra a medida. A Coalizão Negra por Direitos, que reúne mais de 200 entidades do movimento negro, também ingressou com ação na Justiça Federal de São Paulo contra Camargo.
No mesmo mês, o presidente da Palmares chamou de “viciado” o neurocientista negro americano Carl Hart, especialista que relaciona a dependência química a fenômenos sociais. Em reportagem publicada pela Folha, Hart defendeu que usar drogas é parte do processo individual no direito pela busca pela felicidade. “Alguma dúvida de que o negro que a Folha escalou para defender a liberação das drogas é um viciado, não um neurocientista? Não tenho dúvida alguma!”, disse Camargo.
Ainda no mês de junho, ele também se negou a participar de uma audiência pública mediada pela deputada Benedita da Silva, do PT do Rio de Janeiro, sobre a crise institucional da Palmares. “Não me sento à mesa para dialogar com pretos racistas!”, disse Camargo na ocasião, sempre pelas redes sociais.
Até o símbolo da Fundação Palmares foi posto em xeque. Há cerca de dez dias, a instituição abriu um concurso para substituir a sua logomarca, hoje estampada pelo machado de Xangô, em referência ao candomblé e às religiões de matriz africana.
No mesmo dia, Camargo afirmou, mais uma vez pelas redes sociais, que entrará com uma ação contra o cantor Martinho da Vila pedindo danos morais, após o sambista ter tecido críticas a ele durante entrevista ao programa Roda Viva, da TV Cultura. “Ele é um preto de alma branca, como se diz”, afirmou o sambista sobre o presidente da fundação.
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Fonte: BNews